Março lilás termina mas fica o alerta da realização do check-up que pode salvar as mulheres de CA de colo uterino
A linha tênue entre viver e morrer ainda é condicionada em grande parte pelos cuidados de prevenção que passam, entre outros, por exames de rotinas, conforme depoimento da atriz paranaense de 35 anos, Nayane Roma: "Sempre procurei ter um estilo de vida saudável, fui atleta de patinação artística, fazia corrida, tinha uma alimentação regrada. Esse cuidado também incluía minha saúde feminina e fazer os exames de rotina sempre que possível. No entanto, confesso que depois que meu segundo filho nasceu, em 2017, não fiz mais”.
Em 2019, ela procurou uma endocrinologista porque queria emagrecer e ver a parte hormonal, pois andava muita estressada. A médica lhe pediu um check-up geral, incluindo alguns exames ginecológicos, como ultrassom de mama e transvaginal, mas não o Papanicolau. Todos os exames não apresentaram alterações.
Em março de 2020, em plena pandemia com todo mundo fazendo quarentena, a atriz decidiu que não iria fazer o check-up já que no ano anterior tinha dado tudo normal, mas sentiu uma intuição muito forte. “Era como se Deus estivesse me falando para fazer os exames. Ouvi minha intuição e fui na endócrino novamente”, disse.
A especialista achou importante o retorno e aconselhou-a a fazer o acompanhamento anual como forma de prevenção, ainda mais pelo fato de já ter 30 anos e ter dois filhos.
“A médica solicitou os exames e dessa vez incluiu o Papanicolau. Resisti, perguntei se era realmente necessário, nunca gostei de fazer, achava desconfortável, mas ela disse que era importante. Mesmo já tendo feito outras vezes, não sabia para que o papa servia e não imaginava a importância dele. Desconhecia, por exemplo, que ele é capaz de identificar alterações que podem indicar lesões pré-cancerosas no colo de útero”, lembrou.
Nayane fez os exames e todos deram mais uma vez ok, com exceção do Papanicolau que constatou uma infecção de alto grau. A médica questionou se tinha 'namorado mais forte' que pudesse ter provocado algum machucado, mas ela disse que não.
A médica a recomendou de procurar um ginecologista. A última vez que Nayane tinha passado aconteceu na gravidez e no parto de Pedro há 2 anos e meio quando morava em Minas Gerais. “Passei com duas ginecologistas, sendo que umas delas era especialista em colo de útero, com quem dei início ao tratamento”, disse.
“Ao ver os exames, me examinar e fazer uma colposcopia com biópsia, a médica disse que eu estava com uma infecção do vírus HPV e que havia 99,9% de chance de eu ter que fazer um procedimento cirúrgico chamado conização do colo do útero, em que seria retirado um pedaço do colo do útero em forma de cone para ser enviado para biópsia e identificar a existência de células cancerígenas”, informou.
Ela lembrou que ficou muito assustada, primeiro porque desconhecia que tinha HPV, uma doença sexualmente transmissível. Ficou pensando de quem poderia ter contraído, pois era casada há nove anos. Comentou isso com a médica, mas ela explicou que poderia ter contraído o vírus no início da sua vida sexual e ter ficado assintomática durante todos esses anos.
O primeiro resultado, a biópsia da colposcopia, mostrou uma lesão de alto grau NIC III, a um passo do câncer. “A médica me perguntou se eu queria ter mais filhos, respondi que não. Ela disse, então, que iria tirar um pouco mais do útero durante a conização para tentar eliminar o problema de vez. Duas semanas depois fiz o procedimento”, informou.
Para sua surpresa, em julho de 2020, o resultado da biópsia da conização mostrou que ela estava bem no início do câncer do colo de útero, e foi aí que a médica recomendou a retirada completa do útero e das duas trompas. “Meu mundo caiu, fiquei desesperada”, desabafou.
O diagnóstico veio num momento feliz e de realização de sua vida —já era formada em administração de empresas—, mas estava fazendo cursos de artes em teatro, cinema e TV, algo que sempre sonhou desde criança.
Por um tempo, a vida perdeu a beleza pra ela, não via mais nada colorido, só preto e branco. “Me senti impotente e inferior em relação as outras pessoas. No primeiro momento, não aceitei a doença e queria achar um culpado. No segundo, passei a tentar entender as coisas com mais clareza. No terceiro, aceitei a situação e comecei a fazer tudo o que estava ao meu alcance para ficar bem, com fé em Deus e pensamentos positivos”, narrou.
Em meio a tudo isso, descobriu numa conversa com a mãe que nunca tinha tomado a vacina contra HPV, mas que a irmã mais nova, sim, ao ter apresentado alterações em alguns exames na adolescência. “Minha mãe se justificou dizendo que como eu nunca tinha tido nada, não achou necessário”, disse.
Por recomendação da médica que estava fazendo seu acompanhamento, tomou as três doses da vacina contra HPV. A primeira aos 33 anos, antes da cirurgia de retirada do útero e das trompas, e as outras depois. “Operei no dia 6 de agosto de 2020”, informou.
Ela disse que a cirurgia demorou em torno de quatro horas e meia, chegou a ir para a sala de repouso, mas quando acordou da anestesia sentiu muita dor e lembrou de uma coisa que a mãe sempre falou para nunca ignorar uma dor. “Estava muito fraca, chamei o enfermeiro e falei para ele me salvar porque parecia que eu estava morrendo”, narrou.
Uma grande luta para viver tomou conta dos minutos da vida de Nayane, quando a levaram para fazer um ultrassom e viram que estava com uma hemorragia interna — onde já tinha perdido quase um litro de sangue. “Voltei para o centro cirúrgico e fui operada por mais cinco horas. Os cirurgiões explicaram que esse tipo de intercorrência poderia acontecer, mas que cada caso é um caso. No final, deu tudo certo”, comemorou.
“Graças a Deus não precisei fazer nenhum tratamento oncológico, nem quimioterapia, nem radioterapia. Faço acompanhamento por meio dos exames periodicamente —inicialmente era de três em três meses, depois de seis em seis e agora é uma vez por ano”, disse.
“Nesse processo, uma coisa que descobri e que chamou minha atenção foi como outras mulheres próximas a mim, que já haviam apresentado alterações leves no colo de útero e fizeram procedimentos simples, nunca tinham me falado nada”, lembrou.
“Quando aconteceu comigo, liguei e mandei mensagem no grupo de WhatsApp das minhas amigas para contar o meu caso e para perguntar como estava a saúde delas, se elas estavam com os exames em dia. Alertei o máximo de mulheres que pude, porque não fui alertada. Acho importante as mulheres se unirem e passarem essas informações para frente, não guardarem para si”, disse.
“Às vezes, estamos bem esteticamente, com o corpo bonito, mas não sabemos como estamos por dentro. O autocuidado e fazer o check-up periodicamente são fundamentais. Era assintomática, mas estava com câncer. Graças a intuição que Deus usou para falar comigo, o diagnóstico precoce e o tratamento no tempo certo, fui curada, estou viva e com saúde”, alertou.
O que é o CA de colo uterino - Para a ginecologista, Wanúzia Miranda, o câncer de colo uterino se caracteriza por uma lesão que se relaciona com o comportamento sexual e muito frequentemente por um vírus, considerado sexualmente transmissível, por que tem no sexo a principal via de transmissão. “Se apresenta como uma doença que tem lesões pré-neoplásicas até chegar ao câncer e por isso pode ser descoberto em vários estágios de desenvolvimento da doença”, informou.
A ginecologista lembrou que, como se trata de uma lesão pré-cancerosa, nenhum sintoma específico está relacionado à infecção pelo vírus, nem as alterações epiteliais que ele vai formando. Quando se chega ao câncer invasivo de câncer de colo uterino o principal sintoma é o sangramento.
Ela adiantou que a mulher sangra no exercício físico, ao defecar, quando pega em peso e ao realizar até mesmo, a relação sexual. “O sangramento fora do período menstrual se mostra como sinal mais frequente nesses casos de câncer invasivo de colo uterino”, alertou.
Wanúzia lembrou que a prevenção básica preconizada nacionalmente é alcançada nos serviços públicos de saúde com a vacina contra o HPV para meninos e meninas dos nove aos 14 anos de idade, e sistemas privados a partir dos nove anos, que é uma prevenção primária.
Já para a prevenção secundária, a ginecologista destacou que são realizados exames de rastreio da doença, como a citopatologia, considerado o exame principal, conhecido como exame de lâmina ou Papanicolau, que junto com a colpocitologia são absolutamente eficazes em descobrir lesões pré-cancerosas e infecções por HPV.
Segundo a ginecologista, a abordagem de cada lesão depende do estágio em que ela é identificada. “Nos estágios iniciais chamados de lesão de baixo grau, as pacientes são acompanhadas e tratadas, e caso se mostrem persistentes em mais de dois anos de expectação na paciente. Já nas lesões de alto grau a abordagem é cirúrgica, chamada de conização que é feita no ambulatório.
Ela explicou que a conização é feita com anestesia infiltrada no colo uterino e dar a mulher uma conduta conservadora que não atrapalha na gestação e vai poder seguir a vida. Em estágios mais avançados do câncer a conduta é cirúrgica, e os casos com metástase que vão além das estruturas pélvicas, a radioterapia se mostra como uma boa saída, um bom prolongamento e qualidade de vida maior.
Wanúzia lembrou que a idade mais prevalente de aparecer os cânceres invasivos de colo uterino acontece nas mulheres acima de 30 anos, uma idade que pode apresentar uma doença importante, podendo afetar a fertilidade, os sonhos de ter família, de ter filhos, e a mulher estar no auge de sua vida produtiva.
Já as lesões pré-cancerosas, abaixo dos 30 anos, apontadas por ela, podem sem encontradas já nas meninas entre os 16 e 17 anos. “Apresentando essa condição, tem um prognóstico muito bom, pois o fator idade apresenta uma resposta imune eficiente à presença do vírus, onde é capaz de deletá-lo com um tratamento mais agressivo”, informou.
A ginecologista ainda explicou que o HPV é tido como o principal agente etiológico da doença do trato genital inferior ginecológico, como a vagina, colo, vulva e canal anal, que promove alterações do epitélio, lesões pré-cancerosas que desorganiza a estrutura epitelial, até levar ao câncer.
No Nordeste, a Paraíba é o um dos estados junto com Pernambuco que tem maior incidência de lesões de cancerosas e pre-cancerosas de colo uterino induzidas por HPV. “As regiões mais prevalentes e incidentes são o Norte e Nordeste e merecem maior atenção das instituições públicas para que se voltem às campanhas e incentivos à população a fim de fazer os exames de rastreio”, conclamou.
Diagnóstico – Segundo Wanúzia, os exames: Papanicolau, colpocitologia e anatomia patológica são considerados o padrão ouro na identificação e diagnóstico da doença.
Ela explicou que após a confirmação e tratamento da doença, as pacientes são acompanhadas por uma período de dois anos. “Na fase do acompanhamento são realizados exames como citologia e colpocitologia, e caso não apresentem nenhuma alteração epitelial no trato genital, a gente entende que ela tenha deletado a carga viral pelo sistema imune ou por procedimentos que reduziram a carga viral, daí já pode ter alta, embora o rastreamento da doença segue sendo feito até os 64 anos”, lembrou.
Segundo o Instituto Nacional do Câncer, no Brasil, excluídos os tumores de de câncer de pele não melanoma, o câncer do colo do útero é o terceiro tipo de câncer mais incidente entre mulheres. Na análise regional, o câncer do colo do útero é o primeiro mais incidente na região Norte (26,24 para cada 100 mil mulheres) e o segundo nas regiões Nordeste (16,10 para cada 100 mil).
O INCA estima que para cada ano do triênio 2020/2022, sejam diagnosticados 16.590 casos de câncer de colo do útero no Brasil, com uma risco estimado de 15,43 casos a cada 100 mil mulheres, ocupando a terceira posição.
Com informações do Uol
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